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Peripécias e anotações do meu dia-a-dia. Haja alegria! (e família/ amigos, bons petiscos e viagens pelo meio, já agora...)
Há uma semana atrás a minha Mãe contava-me que uma amiga Patologista lhe confidenciava que ultimamente mais parecia Psicóloga, porque mil e um doentes lhe iam bater à porta após receberem os resultados das análises e serem completamente negligenciados nas Urgências. Dizia ela que, para seu grande horror, muitos médicos nas urgências portuguesas (mas nem todos, graças a Deus) simplesmente querem despachar serviço, dispensando doentes com resultados claros de sifílis e outras doenças semelhantes, o que não só é mau para os doentes como favorece a contaminação dos parceiros e afins, mas nada que pareça pesar na consciência desta gente... "Nem imagina o que se passa!". Já trabalhei no sector e já tive algumas peripécias com os meus Avós, mas a última experiência até tinha corrido bem, em Santa Maria, onde fui operada de urgência ao apêndice sem qualquer problema. Ora nem de propósito, três ou quatro dias depois o B acorda a meio da noite com uma dor aguda na zona do estômago/fígado/intestino. Lá rumámos para as Urgências do Hospital de Cascais, onde foi triado como amarelo. Quando nos chamaram, a médica estava ao telefone a discutir com uma enfermeira, assim continua por uns dois minutos até que se levanta e sai com um simples - já volto Sr. Tomás. O B lá foi espreitar quem era o Tomás no computador e era um senhor de 47 anos, claramente não ele. A doutora lá regressa, começa a falar connosco, entretanto chega uma colega e começam em amena cavaqueira, às tantas lá se lembra e examina o Tomás (eu ainda sopro um Bruno, mas não ouve), e finalmente despacha-nos para as análises, não sem antes eu intervir "atenção que este não é o T mas sim o B", ah então passaram à frente, "o quê? chamaram a nossa senha!", ah tem razão, estava trocada a ficha. Por momentos senti-me em África (pela boca morre o peixe, de facto) mas lá avançámos para a zona da enfermagem. Sangue tirado e soro colocado com a medicação, sentamo-nos à espera. Nisto já se tinha passado hora e meia, duas senhoras e um senhor tinham-se juntado, e nisto irrompe a tal colega que apareceu a meio da consulta, e que pelos vistos era a chefe, e tem a seguinte intervenção, a rir e com ar de gozo - "é bom que tenham paciência e estejam confortáveis, porque nós já não vamos fazer nada, agora só daqui a três ou quatro horas é que vos atendem, porque eu preciso de ir dormir, estou nisto desde as oito da manhã, é como se já estivesse bêbeda, portanto agora os colegas que vos vejam. E (virando-se para o B) o senhor está com óptimo ar, se calhar nem devia ter vindo (cor amarela na triagem, relembro), mas seja como for, agora vão ter de esperar, imagine se eu tiver de o operar, não pode ser, o próximo vê-o!", e sai! Eu devo ter feito uma cara de tal ordem (e foi uma sorte ter ficado calada, mas às quatro da manhã também já não raciocinava muito bem), que a médica voltou atrás com umas revistas para ajudar a passar o tempo... Nem sei por onde comece. E atenção que a minha irmã é médica (orgulho!) e eu vejo o quanto ela trabalha e o ritmo que tem. Obviamente acho desumano trabalhar 24 horas seguidas, deve ser extremamente duro, cansativo, enervante, esgotante, uma infinidade de coisas más, mas se não são capazes sugiro que a) não o façam, despeçam-se se quiserem, agora deixar doentes por tratar é que não (e uma das pacientes guinchava que era uma aflição); b) a Ordem se junte e acabe com estes bancos, mude-se o sistema, agora as pessoas pagam por um serviço que é claramente deficitário e estão doentes merecem respeito e bons tratos, já para não dizer que o próprio médico recebe pelo trabalho que não está a fazer; e c) faça um crash course de como lidar com os pacientes, porque claramente há formas e formas de dizer as coisas e gozar com as pessoas é que não. Estava eu ainda em choque, quando somos chamados uns minutos a seguir, efectivamente por outro médico, que dispensou o meu marido dizendo que estava tudo bem. No dia seguinte (ou umas horas mais tarde, diga-se) olhei para as análises e vi uns marcadores alterados, pelo que toca de ir a um bom médico no privado. Claro que ficou bastante surpreso de não terem pedido uma ecografia e reencaminhou-nos para um gastrenterologista que nos conseguiu encaixar nessa tarde. O tratamento foi totalmente diferente, bastantes euros depois. Portanto uma pessoa desconta autênticas fortunas porque supostamente tem acesso à saúde e educação, mas no final de contas tem de recorrer à privada para tudo. Go figure.
Pobres doentes.